domingo, abril 01, 2012

Os livros e as Malvinas




Semana passada estive em Buenos Aires. Foi uma despedida honesta mas discreta: longa conversa com amigos no El Cuartito comento pizza fugazzeta e bebendo Quilmes. O final de uma sequência de talvez mais de uma centena de vezes em que estive no país vizinho na maioria dos meses dos últimos seis anos. Perdi a neve histórica de Buenos Aires em julho de 2007. Ganhei o reveillon dois anos e meio depois em Puerto Madero.

Minha relação com os argentinos é a melhor possível, chegando ao cúmulo de meu sotaque em espanhol ser totalmente bonaerense, e após uma década de admiração seria natural que eu fizesse o mesmo que o governo brasileiro tem feito com relação ao recente enrijecimento da política externa argentina no que tange às Malvinas. O país vizinho volta a requerer a soberania das ilhas. De quebra, acaba colocando os países vizinhos em situação espinhosa. Eu sou terminantemente contra. Não chego a chamar as Malvinas de Falklands – seria afronta gratuita – mas que a questão está resolvida, é fato: as Malvinas não são argentinas, e nem deveriam ser. Mesmo eu era novo em 1982, então, recapitulemos: naquele ano, após séculos de discussões (embora os britânicos estivessem há mais tempo por lá, mesmo porque as ilhas foram descobertas e ocupadas antes mesmo de a Argentina deixar de ser colônia espanhola), a ditadura argentina resolveu invadir as ilhas e retomá-las(?) militarmente. A resposta do Reino Unido não tardou e após uma guerra curta mas sangrenta (morreram 255 soldados britânicos, 3 civis da ilha e 649 soldados argentinos), a Grã-Bretanha saiu vitoriosa. O General Galtieri tentou polarizar a coisa, mas como perdeu a guerra, acabou perdendo o governo e por fim a ditadura argentina, bem mais cruel que a brasileira (e que não contou com anistia nos moldes brasileiros, pelo contrário, levou ao banco dos réus os militares que cometeram abusos) caiu, dando lugar à democracia. Já a dama de ferro, Margareth Tatcher, garantiu a vitória do partido conservador nas eleições seguintes, e se saiu muito bem em casa, mesmo recaindo sobre sí na opinião pública internacional a ordem desproporcional de afundar o cruzador General Belgrano (metade das vítimas argentinas no conflito foram de marinheiros deste navio).

Pois bem, hoje, 30 anos depois do início da Guerra das Malvinas, a presidente Cristina Kirchner evoca mais uma vez sua nação em torno do tema. O governo brasileiro, como de praxe nos últimos anos, se posiciona do lado errado de novo (mesmo na época da guerra, foi neutro mas nem tanto, tendo ajudado aos argentinos. O Chile, por exemplo, se colocou contra a Argentina, e parte de lá, hoje, o único voo regular que serve às ilhas). O Uruguay já se colocou contra a Argentina, e mesmo os argentinos mais esclarecidos se colocam contra a presidente. Assim como Galtieri, Cristina tenta usar o patriotismo ferido da questão para colher dividendos de popularidade. Não está sozinha: numa manifestação que presenciei nesta última estada por lá, até cartazes de uma tal “Juventud Kirchnista” eu vi. Mas claro, a Argentina de hoje não tem o menor poderio militar e está descartada qualquer intervenção nas ilhas. De qualquer forma, Kirchner tem sempre uma surpresinha pros seus compatriotas. A última é restringir a importação de livros (vale ressaltar que 80% dos livros lidos por lá – a Argentina tem um mercado equivalente ao brasileiro – é importada). E o Brasil, por melhor relações que tenha com a Argentina, e por mais que queira manter as coisas assim, deve tomar uma decisão – e se eu puder dar minha opinião – contrária às invenções megalomaníacas de Cristina. Além de prejudiciais aos seu próprio povo, elas podem vir a desestabilizar toda a região. Já foi embaraçoso o suficiente ver Lula cultivar simpatias e mesmo amizades com Chávez, Morales, Assad, Kadafi e Armadinejad. Que escolhamos, nas mãos de Dilma, o lado certo dessa vez.

3 comentários:

  1. Um holandês descobriu (1598), um inglês desembarcou (1690), um francês ocupou ao mesmo tempo que um inglês, mas o primeiro vendeu sua parte pra Espanha. Os espanhóis vão embora em 1811 e as ilhas ficam abandonadas. Os argentinos enviam colonos em 1827, e em 1833 a Grã-Bretanha manda todo mundo de volta e coloca os seus colonos no lugar. Resumidamente, bem resumidamente, é isso.

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  2. O Brasil tomou medidas inclusive práticas em apoio à Argentina. Atualmente, embarcações com bandeira das Falklands estão proibidas de aportar por aqui. Vale lembrar, que imensa maioria dos kelpers (habitantes das Falklands) prefere continuar do lado britânico. E claro que esta postura do governo argentino desencoraja qualquer simpatização do povo local. Até os voos pra lá da LAN (que sobrevoam território argentino) Cristina considera proibir. Ao invés de aproximação e cooperação (que um tratado trilateral da década de 1990 permite), Kirchner parte para intimidação e isolamento. Se o Brasil deve ficar do lado de uma ilhota e não de um país vizinho de 40 milhões de habitantes?! Eu acho que devemos ficar do lado de quem está com a razão. E se tem uma coisa que Kirchner não demonstra ser é razoável.

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  3. Pra vc que é perdido em geografia: as Malvinas ficam tão longe da costa da Argentina quanto o Rio de Janeiro de Porto Alegre:-P Mas ok, elas ficam tão longe da Inglaterra quanto o Rio de Janeiro e Madagascar:-P

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