domingo, julho 31, 2011

Pimenta nos olhos americanos é refresco?

É cada dia mais comum ver governos populistas regorzijando-se da crise americana, mas até onde é inteligente fazê-lo?

O governo americano passa por um momento raro na História: pode pela primeira dar um calote em seus credores. Mas, sem falar economês, iremos destrinchar o que significa isso e onde o Brasil se encaixa neste contexto. Primeiro, é bom lembrar que os EUA e o Brasil são países com realidades completamente distintas. Os Estados Unidos, apesar da longa crise, ainda são a maior economia do planeta, com um PIB – a soma de todas as riquezas produzidas no país – estimado em 14 trilhões de dólares em 2011. O Brasil, uma das principais economias emergentes no mundo, tem o 7º PIB mundial, cerca de 2 trilhões de dólares (sete vezes menor que o americano). E aí vem a primeira comparação pertinente para uma pessoa comum: dividindo-se o PIB pela população, tem-se a renda per capita de um país. Você já deve ter visto o governo brasileiro dizendo que o país vai de vento em popa, e o governo americano lamentando que o país está afundando. No entanto, apesar de realmente estar melhorando, a renda média do brasileiro ainda é de apenas pouco mais de 10mil dólares anuais; frente à renda média do americano, que com crise e tudo, está em mais de 40mil dólares anuais. Ou seja, sem contar que tudo nos EUA é mais barato, mais fácil e de melhor qualidade, o americano médio ganha quatro vezes mais que o brasileiro médio. E o brasileiro médio, como sabemos, não existe de fato. A desigualdade social brasileira é tamanha, que alguém que ganhe os tais 10mil dólares por ano está facilmente entre os 20% mais ricos da população. A expansão do consumo no Brasil nos últimos anos está intimamente ligada à expansão do crédito, e sendo bolha ou não, o fato é que os brasileiros, desacostumados à economia estável – estabelecida na segunda metade dos anos 1990, bem antes do governo atual – não se importam de pagar os juros mais altos do planeta. E o fato destes juros caberem no orçamento não parece ser a linha de corte: mais da metade dos lares brasileiros está inadimplente porque gasta mais do que ganha.

Sigamos. Algumas diferenças entre Brasil e Estados Unidos são pouco paupáveis, principalmente para quem nunca foi lá. Número que também anda diminuindo. O Brasil espera receber para a Copa do Mundo de 2014, nada menos que 600 mil turistas. Mas esse número deixa de ser impressionante tão logo você fica sabendo quantos turistas brasileiros a Disney recebeu ano passado: 700 mil. Por mais inacreditável que seja, a cidade de Orlando, na Flórida, recebe sozinha 8 vezes mais turistas que o Brasil inteiro todo ano. Com crise e tudo.

Mas se viajar pros states está fora da sua realidade, ter um emprego não está. Em muitos índices, o Brasil perfeito e maravilhoso tem desempenho pífio perto dos Estados Unidos engodo e debilitado. O brasileiro lê, em média, 1 livro por ano. O americano, lê 15. A taxa de homicídios brasileira é de 24,5 para cada 100 mil habitantes. A americana, é de 6 pra cada 100 mil. O Brasil tem uma mortalidade infantil de 20 crianças para cada mil. Nos Estados Unidos, são apenas 8. E a coisa segue este caminho em qualquer índice social que se pesquise. Voltando à questão do emprego, um país em pleno desenvolvimento deve ter uma taxa de desemprego baixíssima. Os Estados Unidos, no auge de sua crise, registram uma taxa de cerca de 8%. Pois bem, o Brasil, que segundo o governo vive este momento incrível, registra uma taxa de desemprego realmente um pouco menor, de 6,4% - embora seja relevante lembrar que estes número usam uma nova metodologia, introduzida curiosamente em 2002, ano em que o governo mudou. Frente a poucos dados em que estamos melhores que eles, é importante lembrar também que os EUA são um dos nossos maiores parceiros comerciais, de quem muito compramos e para quem muito vendemos. Ou seja, tripudiar em cima de suas dificuldades atuais, além de deselegante é burrice.

Mas essa máquina da propaganda governista funciona. Pouca gente lembra quem foi que inventou o Bolsa-Escola (que deturpado, viria a se tornar o Bolsa Família), menos gente ainda entende que o bom momento vivido pelo país é em enorme parte fruto de uma colheita feita bem antes de Lula entrar no poder, incluídas aí as privatizações, que modernizaram as comunicações e a indústria do país, e que agora são a solução governista – que quando era oposição na década de 1990, era terminantemente contra – para não dar um vexame muito grande na Copa do Mundo em infra-estrutura de transportes e estádios. Isso sem falar de muitas outras coisas, que vão desde corrupção a ingerência de recursos públicos. Em uma coisa, os Estados Unidos parecem, pelo menos em tempos de crise, lembrar o Brasil: na incapacidade de oposição e governo defenderem o país, e não seus próprios interesses. No Brasil, na verdade, pouca coisa atrapalha tanto o interesse coletivo quantos os interesses particulares do PT e de seu aliado PMDB. A oposição, como bem lembrado pelo governo, está muitíssimo enfraquecida pela máquina da propaganda governista. Quem atrapalha mesmo o povo brasileiro é o próprio governo e seus muitos coronéis e sub-coronéis que precisam ser agradados com dinheiro e poder. Mas, como bem se diz por aí... cada povo tem o governo que merece. E quem há de negar que isso é democracia? Falha, sim, pois um povo sem educação não é livre, e voto obrigatório não existe em país civilizado. Mas vá lá, é democracia sim. Como quase tudo no Brasil, democracia feita nas coxas. E nas costas dos - aparentemente pouco numerosos - honestos. Não sei vocês o que sentem, mas para mim é extenuante ser correto num país tão errado.


2 comentários:

  1. otimo texto. afinal sao tantos mamando, nem que seja um bolsa familia que fica dificil retornar ao bom rumo anterior. infelizmente, vamos acordar tarde.

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  2. Adorei seu texto e realmente concordo. O problema da população brasileira é falta de informação - não por que é complicado - mas porque eles não querem saber.
    O brasileiro tem o defeito de querer saber de politica uma semana antes da votação, e o pior e que sempre escolhe o lado errado. Eles não cobram o governante durante os 4 anos, só espera para ver o próximo.
    O problema e que a maioria é folgada, não quer trabalhar e quando vê uma oportunidade de ganhar dinheiro fácil - como o bolsa família - se encosta de vez. Eu sei que tem muito trabalhador que rala todo dia, mas também tem muita pessoa, principalmente mulheres (mesmo sendo uma), que prefere engravidar para ter um aumento no bolsa família, onde já se viu isso?
    Se nós pretendemos ter um país igual, sem muita diferença temos que estudar, ler, procurar saber o que está ocorrendo, e principalmente cobrar nossos governantes.
    Não adianta nada ser a 7 economia do mundo e ainda ser a 1 em desigualdade, somos piores que países africanos, repito: onde já se viu isso?
    O problema não está na escória de governantes que controla, mas quem deveria observar, onde já se viu a educação ficar no nível tão baixo (entre os 100 e 150), perdemos para a Argentina.
    Do que importa vencer no futebol, ser a 7 potência econômica do mundo e ninguém da população brasileira ver realmente algo mudar a nosso favor?
    Yasmin
    lerimaginar.blogspot.com

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