O Brasil que quase ninguém vê.

Acima: mapa mundi segundo IDH. Verde escuro é excelente, preto é péssimo. Amarelo é mais ou menos, bem mais ou menos.

Por estes dias, um artigo bastante extenso do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, sobre como a oposição deveria se portar diante do governo, foi bastante comentado. Ele nos leva a refletir sobre o país que vivemos, mas muito mais, o país que queremos. O link para o artigo eu deixo aqui, do Blog do Noblat. Assim vocês poderão ler e tirar as próprias conclusões. Eu, racional que sou, direi um pouco do que achei do artigo, e muito do que acho do Brasil. Fiquem à vontade para comentar.

O Brasil vive uma grande oportunidade e um grande risco. A grande oportunidade é a de se tornar uma nação muito mais importante no cenário mundial do que já é - embora essa seja a parte fácil. O grande risco, é que o despreparo de um povo predominantemente pobre e sem instrução transforme todos os avanços até aqui - que fique claro, consequência de acertos de ambos os governos, do PT e do PSDB (e quem diria, até Collor, ao abrir a economia, mesmo que discretamente, contribuiu pro cenário que temos hoje) - num voo de galinha que deixará o Brasil sem fôlego para avançar.

Lá fora, somos vistos como um sucesso. O governo do PT expôs muito bem os milagres, mesmo sem dar sempre crédito aos santos certos. Acontece, que ser a 7a economia do mundo não é a solução de todos os problemas. Nosso PIB torna-se ridículo quando dividimos pela nossa imensa população. Nossa pífia renda per capita é de pouco mais de US$10mil. Metade da portuguesa, um quarto da americana, dez vezes menor que a do país mais bem sucedido neste quesito, Luxemburgo. Mas a comparação é tola, mesmo porque, mais que a renda per capita, o que verdadeiramente influencia na vida dos cidadãos de um país é a distribuição de renda, que o IDH (índice de desenvolvimento humano) expõe imperfeita porém mais precisamente. Além da renda per capita, ele mede expectativa de vida e escolaridade - coisas bem pontuais ainda, mas que refletem em pontos importantes como saúde e segurança.

Neste índice, tomamos um baile de todo mundo. Estamos em 73o lugar. Ou seja, a 7a economia do mundo oferece uma qualidade de vida de 73o lugar para seus cidadãos... Sem entrarmos em comparações desnecessárias sobre qual governo conseguiu o quê - mesmo porque os governos mudam, mas o país é o mesmo, cada um colhendo frutos e amargores do anterior - é um desempenho no mínimo vergonhoso. Sem nem citar países ditos desenvolvidos, estamos muito atrás de Chile e Argentina (45 e 46), do Uruguai (52), do México (56) e do Perú (63).

Temos uma das mais altas cargas tributárias do mundo, ao invés de estimular a produção - para equilibrar oferta e procura - o governo prefere conter o consumo cada vez que a inflação ameaça voltar. Mas 90% dos brasileiros não percebe isso. E creio que não cheguem a 10% os que reconheçam isso - mesmo que internamente. Estamos definitivamente no caminho errado. Juros altos e impostos altíssimos penalizam a sociedade pela inépcia do Estado.

O Brasil é uma plantação de alface. Há países minúsculos que produzem caviar. Nós gastamos quilômetros e quilômetros quadrados para que tenhamos alface suficiente para nos equipararmos em faturamento àquele pequeno produtor de ovas de esturjão. Em resumo, só somos "ricos" porque somos grandes. Mas cada cidadão brasileiro, principalmente a tal nova classe média que desfruta de uma pseudo-ascensão à prazo (uma poupança forçada cujo grande beneficiado é o banco), leva uma vida difícil, sem educação de qualidade, saúde ou segurança, os verdadeiros pilares de uma sociedade realmente livre.

O Brasil é uma grande mentira, um engodo, uma terra de oportunidades para oportunistas (e não para empreendedores, como deveria ser). E o caminho, como sempre foi e sempre será, é a educação. Desprezada há muito pelas politicagens, sejam elas de que partido for. Fernando Henrique Cardoso, o sociólogo, só disse o óbvio, realmente: todos vemos, mas poucos somos os que enxergamos.

Enderson Rafael é escritor.