quarta-feira, março 09, 2011

No está sola, está lejos























Essa é uma das mais belas frases que definem a Ilha de Páscoa, ou no seu nome polinésio, “Rapa Nui”. A pequena ilha no Pacífico Sul marca o extremo leste do vasto domínio dos polinésios, e assim como eles, eu também sempre fui bem desgarrado. Morei em 14 casas, em 4 cidades diferentes, e agora estou indo para a décima quinta casa numa quinta cidade. Isso por si só já seria um empecilho para qualquer amizade mais duradoura, mas como sempre volto aos locais onde já morei, guardo amigos de quase a vida toda, embora seja inegável o prejuízo que esta mobilidade trouxe às nossas memórias.

Se já era difícil eu encontrar os amigos de Florianópolis quando me mudei para Teresópolis, e se me mudei para Teresópolis justo naquela fase da adolescência em que se começam os voos mais longos, as festas, os clubes, então, meus amigos mais próximos acabaram sendo os teresopolitanos, com quem mantive mais contato mesmo porque meus pais continuaram morando na cidade serrana.

Mas ainda assim, um outro capítulo estava por se desenhar na minha vida. Eu suportava bem a distância, mas não o tempo. E quando voltei para Florianópolis para trabalhar, já formado, e percebi a falta que me fazia minha família e meus amigos do Rio os quais só veria uma vez ao ano, foi que a aviação acabou de vez de me seduzir: eu sempre gostara de aviões, mas correndo por fora, essa ideia da mobilidade foi a gota d’água para que eu me apaixonasse. Tornei-me comissário de voo, uma profissão de extremada honra – proteger as vidas de seus colegas e passageiros e levá-los com segurança aos seus destinos – e que levaria meu conceito de distância, tempo e mobilidade a outro patamar.

Hoje, 5 anos e 4 mil horas de voo depois, são milhões de quilômetors voados, trezentos mil passageiros transportados e umas sessenta cidades visitadas em mais de uma dúzia de países de vários continentes, incluindo a encantadora Rapa Nui, onde estive por uma semana nas férias de 2008. E essa profissão, ou pelo menos essa mobilidade, parece ser invejada por muitos “terráqueos” que conheço.

Tudo bem: conheci gente, cultura, lugares, que nunca conheceria de outra forma. De Porto Velho a Santiago do Chile, da Bolívia à Escócia. Mas e os churrascos com os casais de amigos? E as Páscoas com a família? E os feriados na praia? Se os momentos bons já são doídos de perder, que dirá os tristes? Dos amigos que estavam doentes ou chorosos; do pai que estava internado para nunca mais no hospital enquanto você passava o mês todo longe, ou do irmão que se foi logo depois quando você estava a 3 mil quilômetros de distância?

Há um preço, caro. Mas se a saudade voa conosco, significa que há alguém esperando que voltemos. E se abrimos mão do nosso Natal com nossa família para levar você para perto de sua, não sei até que ponto é uma questão de dinheiro ou paixão, uma linha tênue que envolve todos os que tripulam aeronaves, e em última instância, que transportam pessoas.

Dizem que todos nós somos ilhas, e se assim é, eu não estou só, estou apenas longe, como Rapa Nui.

Enderson Rafael é escritor, redator publicitário e comissário de voo.

Um comentário:

  1. Sabe Enderson,
    vou te contar a verdade, desde que eu assisti pela primeira vez 'Voando Alto' com a Gwyneth minha vontade de ser comissaria aumentou - eu sempre havia gostado, essa coisa da mobilidade, de conhecer outros lugares, de não ser uma profissão rotineira (pavor) ... rs... As vezes penso em fazer um curso para isso!

    Acho que isso pode mesmo revelar os verdadeiros amigos, que permanecem para sempre!
    Ahh adorei te conhecer lá no evento da Fnac Barra, eu era a garota da saia azul #atrizwannabe ahahahhaha

    Hey Evellyn!

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